Cinco Microfones Profissionais para Home Studio

Desenhamos um mapa para te ajudar a escolher um microfone profissional que vai atender às reais expectativas de trabalhos produzidos no seu home studio.

Existem algumas coisas na vida que a gente pode considerar como essenciais e aquelas que podemos considerar supérfluas. Você não sobrevive sem água e sem ar, mas consegue viver bem ainda que nunca tenha a oportunidade de passar as férias na Disney. Em uma construção, o cimento não pode faltar, mas o piso em porcelanato talvez não seja tão essencial na finalização. Sem combustível o carro não anda, mas se não puder colocar rodas de liga leve em vez de rodas de ferro, o carro não vai parar por causa disso.

Nesse pequeno universo chamado home studio, a gente já sabe que dá para produzir música profissional sem precisar vender o carro para comprar a UAD Apollo mais cara do mercado, sendo que uma interface que custa 10 vezes menos já dá conta. Já sabemos que existem alguns itens que sem eles a coisa não anda, o processo para. Interface de áudio, computador e microfones estão no meio dessa leva essencial para o home studio. Nesse ponto, vamos dar uma estacionada na galeria dos microfones. O assunto é vasto, mas, como de costume, vamos nos apegar aos princípios básicos.

O microfone é um transducer, mecanismo que transforma uma forma de energia em outra forma diferente. Ele transforma as ondas sonoras, energia mecânica que se desloca no ar, em energia elétrica, que representa através de sinais de áudio o som capturado pelo microfone. Até o final do século XIX, antes de o microfone ser inventado, o som não tinha como ser ouvido em outro tempo e lugar. Hoje, porém, você pode falar no Rio de Janeiro e ser ouvido em Berlim, pode falar em 2022 e ser ouvido daqui a 100 anos. Graças a esse dispositivo que transforma a energia sonora de um jeito que é possível registrá-la, armazená-la e processá-la, o som da nossa voz, da nossa música e de qualquer ruído pode viajar facilmente pelo mundo afora, sem limitações de espaço e tempo. Por meio dessa pequena e maravilhosa ferramenta, essencial para qualquer home studio, é possível capturar o som de qualquer fonte sonora que se possa imaginar.

Hoje em dia, existe uma infinidade do opções na hora de escolher um microfone. Porém, quando pensamos na realidade de um home studio e produções caseiras, os fatores preço e versatilidade pesam muito na hora da escolha. Mas existe ainda o fator custo-benefício que pode ajudar na hora de decidir pela ferramenta ideal de trabalho. Em muitos casos, um microfone caríssimo pode funcionar de maneira horrível se o ambiente onde ele for utilizado não estiver com tratamento acústico. Por outro lado, um microfone mais barato pode ser a escolha certa para se obter resultados profissionais no quintal de sua casa ou na varanda do seu apartamento.

Vamos tentar fazer um mapa para ajudar a escolher um microfone profissional que vai atender às reais expectativas de trabalhos produzidos em home studio. Seguindo por este caminho, considerando que muitos homes não possuem tratamento ou isolamento acústico adequado, vamos focar principalmente nos microfones dinâmicos. Isso porque, de modo geral, eles captam menos da ambiência e isso é ótimo para os espaços sem tratamento. Se o ambiente está ruim, melhor que ele fique fora da equação. Corre o risco de ficar um som mais seco, mas isso é fácil de resolver na mixagem, basta colocar um “reverbezinho” usando tecnologias como impulse response que permitem escolher e acrescentar na receita salas famosas como a Abbey Roads, na Inglaterra, ou Oceans ways, na Califórnia. Por outro lado, se o som captado vier com ambiência ruim, aquele famoso som de banheiro, é quase impossível resolver esse problema durante a mixagem. É como se os microfones dinâmicos filtrassem as imperfeições de um ambiente com ruídos e problemas acústicos. Claro, isso tem um preço, eles acabam sendo menos detalhistas que os condensadores. No final, não fica tão difícil escolher entre o detalhe que não funciona e o profissionalismo que resolve.

Na vasta gama dos dinâmicos, vamos nos apegar aos microfones clássicos, aqueles que são figurinhas carimbadas em qualquer estúdio profissional do mundo. Aqueles que já apareceram em gravações famosas e de sucesso incontestável. Se foi bom para eles, porque não funcionaria para nós? Claro que também vamos dar uma pincelada em um condensador clássico para aqueles que conseguiram ou têm planos para tratar a acústica do home studio.

Abaixo segue uma lista de microfones clássicos nos quais você pode investir sem medo.

Shure SM57

Richard M. Nixon

A história do sm57 começa com o Shure 55 que foi popularizado por Elvis Presley. O 55 veio com uma cápsula chamada unidyne, que provou ser uma ótima alternativa, e barata, para os caríssimos e frágeis microfones de fita ou condensadores. Logo depois, o engenheiro da Shure, Ernie Seeler desenvolveu a unidyne III, perfeita para integrar o sm57 que trouxe uma carcaça segura e resistente que visava atender a demanda do batente pesado e rigoroso do dia a dia das TVs que cresciam em popularidade. O S de “studio” e M de “microphone” no começo era referência aos estúdios de TV em vez de estúdios musicais. Em pouco tempo correu a fama deste microfone que virou referência para os estúdios de TV. Seu padrão cardioide que rejeitava maravilhosamente as imperfeições e ruídos do ambiente, seu corpo robusto à prova de balas que se mostrou seguro para uma pesada rotina de trabalho e o excelente resultado que entregava em situações onde eram exigidos volumes extremamente altos, fez com que, além dos estúdios de TV, o universo musical se apaixonasse por ele.

A verdade simples é que o sm57 vai gerar bons resultados em quase todas as aplicações possíveis. Na música, no rádio, na TV ou em gravações ao ar livre, esse microfone sempre vai entregar bons registros. No caso do home studio, vai gravar bem as guitarras, a voz, violão e diversos outros instrumentos acústicos. É ótimo também para gravar caixas e tons de bateria, devido à sua alta taxa de SPL, que é a taxa que indica o quanto de pressão e volume a capsula suporta, antes de distorcer.

Vale ressaltar ainda sua construção, que foi projetada para suportar grandes adversidades. Durante os testes, os engenheiros da Shure submeteram o pequeno aos mais diversos tipos de abusos, como deixar cair de lugares altos, mergulhá-lo na água e ainda tiveram a coragem de colocá-lo no forno para assar. Como resultado, este é um microfone para trilhar em meio as mais diversas tribulações que o dia a dia de músico pode gerar, sem quebrar no meio do caminho.

É notório que, desde que foi lançado em 1965, todos os presidentes americanos usam o sm57 e cada novo presidente recebe uma caixa vip com dois exemplares. Saber que ele não vai parar no meio de um pronunciamento já é um bom motivo para manter a tradição.

Sabe-se que o Red Hot chilli Peppers gravou todo kit de bateria de sugar black magic usando apenas microfones sm57, e o seu vocalista, Antony Kids, grava todos os vocais usando esse velho guerreiro. Para capturar a energia necessária para o álbum de estreia do The Killers, Brandon Flowers gravou seus vocais com um sm57. Portanto, se foi bom o bastante para nomes como Fleetwood Mac, pode ser que resolva também para o nosso home studio.

Características como robustez, versatilidade, qualidade e tudo isso por U$100,00 fazem com que o sm57 reine absoluto sobre todos os outros microfones nos melhores estúdios do mundo.

Em Californication, Anthony Kids, como sempre, usou o SM57 em seus vocais

Shure Super55

O Shure 55 é o pai dos microfones dinâmicos. Como mencionado no tópico anterior, a cápsula do 55, a unidyne, foi a primeira dinâmica unidirecional criada no mundo. A unidyne foi revolucionária porque, além de conseguir reproduzir com alta qualidade sonora a resposta frontal, anulou a resposta sonora produzida em suas costas. Isso reduziu de uma só vez, os problemas com feedback, reverberação e os ruídos indesejados do ambiente. Apenas o som produzido em sua frente, em sua direção seria projetado. O catálogo da Shure na época apregoava “Você capta o som que você quiser, do jeito que você quer”. 

Metallica

Além disso, todas essas virtudes revolucionárias do Shure 55 foram oferecidas por um baixo custo: $45,00, na época. Não deu outra, o 55 foi um sucesso instantâneo. O engenheiro da Shure, Benjamim Bauer, trabalhou de 1937 a 1939 com sua equipe para se chegar à primeira versão da unidyne, que com variações da resistência acústica conseguiu consolidar os padrões cardioide, super cardioide e hiper cardioide. Foram intensos dois anos de pesquisas, intuição, testes e genialidade para construir a ferramenta que mudaria para sempre a história da captação do som.

A qualidade sonora e a confiabilidade que cercaram o Shure 55 foram confirmadas e celebradas no mundo do áudio profissional por nomes como Frank Sinatra, Elvis Presley, Ella Fitzgerald e muitas outras celebridades, além de reis, rainhas, presidentes e generais. E hoje, mais de 80 anos depois, o Shure 55 permanece praticamente o mesmo e tão popular quanto na época em que foi lançado. Billie Elish faz par com um deles no clipe do tema do último 007 que faturou o oscar de melhor canção, e é também o preferido pelos caras do Metallica para captar a energia dos vocais em seus shows. A verdade é que o Shure 55 transpôs os limites técnicos do áudio e se transformou em um ícone cultural, atravessando décadas e décadas sem sair do catálogo da Shure, permanecendo fiel ao mesmo design criado em 1939.

Atualmente, a Shure mantém duas versões: o 55sh e o super 55. Enquanto o 55sh mantém o padrão cardioide, o super 55 é super cardioide. Esse padrão da versão mais moderna, super cardioide, rejeita ainda mais os ruídos e problemas encontrados em um ambiente sem tratamento, tornando-se uma escolha sem temores para home studio. Com sua resposta de frequência otimizada em relação aos irmãos mais velhos, é perfeito para gravar voz falada, cantada, violões e outros instrumentos acústicos. Funciona maravilhosamente bem para rádio e TV, podcasts e, além de tudo isso, seu apelo visual é imbatível em vídeos.

Vídeo da Billie Elish

Seinnheiser MD421

Jane Fonda

O MD421 também remete aos primórdios dos anos 50 e 60. Projetado na Alemanha, em 1959, para substituir o irmão mais velho MD21, este é um microfone que 75 anos depois, continua fiel ao design original e usado pelo mundo do áudio profissional. O MD21 já era um grande sucesso na Europa, porém seu padrão omni restringia sua versatilidade em aplicações onde as condições não fossem tão favoráveis quanto em um estúdio. Talvez impulsionada pelo enorme sucesso do Shure 55, a Seinheiser reuniu forças e desenvolveu seu microfone dinâmico com padrão super cardioide que, diferentemente do antecessor, poderia ser usado em diversas situações, por amadores e profissionais.

Um microfone robusto feito para atender aos padrões dos mais exigentes estúdios e que, graças ao seu diafragma largo, garantia uma resposta de frequência semelhante aos condensadores, entre 30hz e 17khz. Mas, diferentemente dos frágeis condensadores, esse cavalo de carga era capaz de fazer ótimos registros de fontes sonoras em altíssimos volumes, assim como o seu concorrente americano. Porém, o MD421 vem com alguns mimos extras, o próprio diafragma largo coloca esse microfone em um patamar de destaque entre os dinâmicos. Além disso, ele traz um esquema de compensação de ruído para evitar interferências e opções para corte de graves, o que garante flexibilidade para reduzir o efeito de proximidade, que é algo comum entre os microfones dinâmicos. Quanto mais próximo da fonte, mais acentua os graves do registro sonoro, o que garantiu mais foco na voz falada, por isso virou uma febre nos programas de rádio e TV. Além de Todas essas virtudes, esse microfone é uma ótima opção para situações ao ar livre ou para lugares sem tratamento acústico, já que não capta praticamente nada que é gerado em suas costas e atenua consideravelmente o que é gerado nas laterais. Palmas para seu padrão super cardioide.

Esse microfone é um lugar seguro para qualquer estúdio de gravação profissional, um dos melhores para registrar bateria e percussão. Funciona maravilhosamente bem com instrumentos de sopro e metais, que são naturalmente agudos e podem ter ruídos desagradáveis devido aos seus botões, válvulas e chaves. Como o MD421 oferece uma resposta de graves praticamente linear até 1k, ele captura com solidez os harmônicos fundamentais do instrumento, oferecendo riqueza e suavidade no timbre. Acima de 1k produz médios macios, prevenindo contra o excesso de volume e agudos que esses instrumentos podem produzir.

Já em apresentações ao vivo, também é o preferido para grandes concertos, como o realizado em 1971 por George Harrison e Ravi Shankar em prol de Bangladesh, onde todos os vocais, incluindo Eric Clapton, George Harrison e Bob Dylan, tiveram suas performances capturadas pelos MD421.

Hoje custa cerca de U$400,00, mas foi lançado por cerca de U$45, tornando-se um sucesso instantâneo na Europa. Atualmente, com mais de 500 mil microfones que permanecem operando desde 1960, quando foi apresentado ao mundo, o MD421 é um padrão em termos de qualidade e consistência, utilizado extensivamente em rádio e TV, e aclamado nas gravações em estúdio, registrando majestosamente, vocais, amplificadores de guitarras e baixo, percussão, bateria, sopros e metais.

George Harrison e Bob Dylan

Electro-Voice RE20

O RE20 é considerado por muitos o topo da cadeia dentre os microfones dinâmicos. Quando esse microfone foi lançado em 1968, a Electro-Voice já era uma veterana no universo do áudio profissional. Fundada nos Estados Unidos em 1927, e mesmo tendo cambaleado com a grande depressão em 1930, conseguiu depois de trabalhar algum tempo na engenharia voltada para o Rádio, direcionar forças somente para o áudio profissional. Em 1960, a empresa já havia faturado vários prêmios e patenteado 27 novos produtos. Reza a lenda que um dos fundadores, para demonstrar a durabilidade de seus produtos, usava um de seus microfones para martelar um prego numa placa, depois o plugava para falar algumas palavras.

Steve Wonder

Em 1953, a Electro-Voice desenvolveu a tecnologia chamada Variable-D que, 15 anos depois, viria a ser essencial no RE20. Na prática, essa tecnologia eliminou o efeito de proximidade, característica comum dos dinâmicos que acentua os graves quando se posiciona o microfone próximo da fonte. A Electro-Voice implementou uma tela ao longo do corpo do microfone e essa tela molda entradas que filtram variadas frequências de acordo com a distância da entrada até o diafragma. As altas frequências penetram pelas mais próximas do diafragma, as baixas pelas mais distantes. Isso possibilita que o microfone seja posicionado próximo a instrumentos e equipamentos com graves pesados sem permitir que estes fiquem sobrecarregados. Engenhosidade sensacional! A Variable-D, associada à sua resposta de frequência incrivelmente flat e um “pop filter” interno feito de poliuretano, praticamente elimina os ‘P-pos’ de sons explosivos de ‘p’ e ‘b’. O RE20 chegou ao mundo apresentando profundidade, maciez e brilho na medida certa, com sua capacidade de capturar o som natural da voz. Seu padrão de captação oferecia pouquíssima oscilação de volume quando um locutor de rádio movia sua cabeça de um lado para outro enquanto falava. Não foi surpresa a paixão dos radialistas que na época tinham voz grave como padrão e, dessa forma, o microfone se transformou no mais usado do mundo em broadcasting.

Já não bastasse tudo isso, ainda possui uma chave que atenua as frequências abaixo de 400hz, útil para situações nas quais os graves precisam ser mitigados, e incorporou a tecnologia criada pela Electro-Voice em 1930, onde uma bobina “hum-bucking” era enrolada fora da polaridade da bobina principal do microfone. Esse sistema, criado quase 40 anos antes do lançamento do RE20, foi responsável por cancelar as interferências eletromagnéticas e deixar o som capturado limpo como uma lágrima. Apesar de sua impressionante clareza, ele rejeita singularmente o excesso de sibilância. Não foi por acaso que em uma matéria publicada pela renomada revista soundonsound em 2010, onde testes cegos foram feitos com vários microfones de vários tipos e preços, o RE20 foi eleito o melhor microfone para vocal masculino de RAP e ganhou notas altas em vários outros estilos de cantores.

Diferente dos condensadores e microfones de fita, os dinâmicos são famosos pela sua robustez e capacidade de suportar altos volumes. Mas o RE20 vai um pouco mais além, ele foi projetado para ser forte e sensível ao mesmo tempo, oferecendo uma versatilidade rara de se ver e ouvir. Ele não foge da luta e trabalha de um jeito maravilhoso para captar bumbo, tons e amps de baixo. Mais uma vez, graças à Variable-D, pode ser posicionado bem próximo sem superfaturar os graves. Porém, quando a Electro-Voice, em 1968, concebeu o RE20, a ideia era fazer um microfone dinâmico que pudesse competir com a alta fidelidade dos condensadores. E realmente com seu diafragma acusticamente largo e sua bobina de alumínio de pouquíssima massa, ele é capaz de reproduzir uma vasta faixa de frequência com uma excelente reação de transiente e, por isso, esse microfone se mostrou páreo com a sensibilidade hi-fi dos condensadores. Apesar de sua força bruta, ele é delicado o suficiente para perceber e recolher divinamente, as nuances de um violão acústico, metais e até mesmo usado para overheads.

O RE20 é um sucesso nos estúdios de Rádio e TV, ocupando espaço em programas tradicionais por todo o planeta. Mas os produtores musicais também perceberam seu poder e versatilidade, por isso já foi recrutado para gravar os vocais de Steve Wonder nos álbuns Talking Book, de 1973, e Innervisions, de 1973. Em 1999, combinado com outros mics, foi usado para gravar os amps de guitarra do álbum Supernatural, de Carlos Santana. Você também pode ver e ouvir o vocalista do Radiohead trabalhando com um deles no clip da música All I Need. Isso, só para citar alguns. Como falamos no início, ele é considerado o topo da cadeia dos dinâmicos, mas é também o mais caro, custa $450,00, um investimento para vida toda.

Radiohead

AKG C414

Fred Mercury

Neste artigo priorizamos os microfones dinâmicos porque, quando falamos de ambientes não tratados, ele é certamente a melhor opção para captação de áudio em um padrão profissional, visto que rejeita significativamente as imperfeições e ruídos do ambiente. Por outro lado, nós sabemos que muitos donos de home studios investiram em isolamento e tratamento acústico. Em um ambiente, mesmo caseiro, que foi tratado acusticamente vale a pena pensar também em um bom microfone condensador como opção.

É por isso que depois de passar pelos dinâmicos clássicos, usados e aprovados por mega estúdios e mega produtores, vamos dar uma estacionada num condensador que é padrão de qualidade e versatilidade. O AKG 414 é um tiro certo, não tem erro.

A história do C414 começa em 1953, quando a AKG introduziu a cápsula CK12 que equipou os condensadores C12, microfones valvulados que se tornaram um padrão na indústria do áudio profissional e hoje valem verdadeiras fortunas no mercado de usados. Nos anos 60, com o advento do transistor, a AKG começou a substituir as válvulas e lançou o solid-state C412, usando a cápsula CK12. Mas o C412 logo deu lugar ao C414 que além do Omni, cardioide e figura oito, presentes em seu antecessor, adicionou o padrão super cardioide. O C414 nasceu oficialmente em 1971.

Os primeiros C414 trouxeram muito das características do C12, devido ao uso da mesma cápsula CK12, que entregava médios limpos e transparentes além de um agudo maravilhoso que nunca soava estridente. Característica que os distinguia dos Newman, que tinham graves encorpados.

No entanto, aconteceram algumas mudanças em seu design durante sua trajetória. Alguns anos depois de lançado, a AKG substituiu a cápsula CK12 por outra que já não trazia os mesmos agudos cristalinos. Nos anos 80, o C414 B-ULS foi lançado com alguns novos apontamentos e se tornou o mais bem sucedido entre os 414. Porém, muitos engenheiros reclamavam da perda dos agudos tão apreciados, característica dos primeiros modelos lançados. Então a AKG lançou em 1993 a série B TL-II com uma cápsula muito mais brilhante que emulava o som da CK12. Porém, como não dá para agradar todo mundo, os fãs do B-ULS, que não conheceram a CK12, reclamaram que este novo modelo era agudo demais. Por fim, em 2004, a AKG lança também o B-XLS que, além de apresentar nove padrões polares e leds, recupera o som do popular B-ULS.

A AKG manteve durante algum tempo tanto o TL-II quanto o XLS em seu catálogo. O TL-II com design da cápsula projetado para resgatar as mesmas características do C12 e seu boost de presença em 3kHz, ótimo para vocais e instrumentos solo. Por outro lado, o XLS entrega a mesma resposta neutra de frequência do ULS – ultra linear sound, o que significa captar o som da fonte com fidelidade e transparência e quase nada de coloração. A verdade é que qualquer versão vai soar magnífica onde quer que seja.

Atualmente, C414 B-XLS é o único que permanece em produção. Com sua versatilidade, pode ser usado em qualquer aplicação. Violões, bateria, cordas, cantor de ópera, cantor de jazz, sinfonia, em qualquer coisa que emita som, ele vai fazer o melhor registro que se é possível fazer. É o tipo de equipamento do qual é quase impossível tirar um som ruim. Faz parte de qualquer setup de estúdios e produtores ao redor do mundo. É claro que, em se tratando de home studio, se o ambiente não estiver minimamente tratado para evitar reverberação e ruídos, tudo isso vai pro brejo.

É importante saber que o XLS traz múltiplas opções de configurações, que vão permitir moldar o padrão de captura para cada tipo de aplicação. Com três opções de filtros para cortar baixas frequências, isso ajuda a reduzir o efeito de proximidade, ruídos de vento, sons explosivos (p-pops) e o nível de distorção low-end de fontes com baixos ultra pesados. Além disso, oferece três padrões para reduzir o nível de output, o que é muito útil para evitar overload quando se grava fontes com altos níveis de volume, como amps de guitarra e bateria. Para fechar o pacote, ela ainda oferece cinco padrões de polaridade, Omni, cardioide, super-cardioide, hiper-cardioide e bi-direcional (figure-8). Com tantas opções, é possível usar esse mic em uma infinidade de situações.

No teste cego feito pela soundondsoun, quando comparado com outros 14 microfones, incluindo Newman u47, Tlm103 e o AkG c12, o 414 B ULS foi escolhido o melhor microfone para vocal masculino e ainda obteve ótimas notas e resultados em cantora lírica e cantora pop. Nenhum outro microfone, até mesmo os mais caros, saíram-se tão bem no teste quanto ele. Se quiser um condensador que é padrão de qualidade e versatilidade, não tem como dar errado com esse magnifico design, qualquer que seja a versão. Comparado com os outros microfones estudados neste artigo, é bem mais caro que os outros. Porém, é bem mais barato que os Newman e muitos outros. E a entrega que ele faz vale cada centavo investido. Possivelmente, não existe um só produtor ou artista de sucesso que nunca tenha usado esse microfone. É impossível passar pela vivência em estúdios profissionais e nunca ter se deparado com um desses em algum momento. É o lugar seguro de artistas como Chris Martin, do Coldplay, e já foi parceiro de Fred Mercury, Geddy Lee, Bono Vox e David Bowie. Por essas e outras que, se em algum momento, um AKG 414 aparecer na sua frente, dê uma chance para ele.

Vocal de Geddy Lee, do Rush, em Tom Sawyer

Testes comparativos

Shure SM57 x AKG C414 B ULS

Abaixo o SM57 e o C414 nas mesmas condições de uso.

Faixas gravadas em sequencia com microfones Shure sm57 e AKG 414 uls B, UAD Apollo twin, Logic Pro e processadas com UAD Neve 1073, Fairchild 670 e EMT 140.

Guitarras gravadas em logic pro com UAD Apollo Twin; amp – orange tiny terror HW :delays – strymon timeline; Telecaster pickups – Klein

Takes gravados em logic pro com UAD Apollo Twin; Processados com UAD neve 1073, fairchild compressor e EMT 140 reverb.

Nota

Para escrever este artigo foi feita uma extensa pesquisa e muitas informações foram colhidas de diversas fontes. Abaixo seguem algumas delas:

Vocal Mics

https://www.soundonsound.com/techniques/vocal-mics

Gear Tribute: The Shure SM57, From 'Rumours' to The White House

https://reverb.com/news/gear-tribute-the-shure-sm57-from-rumours-to-the-white-house

How the Shure SM57 became an industry standard microphone – from presidential duties to pop

https://www.musicradar.com/news/how-the-shure-sm57-became-an-industry-standard-microphone-from-presidential-duties-to-pop

Sennheiser MD 421

https://en.wikipedia.org/wiki/Sennheiser_MD_421

Get all-time classics for your (home) studio

https://en-us.sennheiser.com/newsroom/get-all-time-classics-for-your-home-studio

Celebrating 421 Day And The Legacy Of The Sennheiser MD 421

https://vintageking.com/blog/2022/04/sennheiser-md-421/

Renato Coelho

Renato Coelho, compositor, cantor e guitarrista